segunda-feira, março 6

Nada muda, efectivamente

Faltam poucos dias para que Jorge Sampaio faça entrega das suas funções de Presidente da República a Cavaco Silva.
Alguns Portugueses perguntam-se o que vai mudar em Belém. Pois, na minha opinião, para além da cor de alguns cortinados nas janelas e um ou outro pormenor, tudo, do mais importante, ficará na mesma. Por enquanto, o estilo vai ser semelhante ao anterior. E, passados um ou dois anos, tudo se manterá. Porquê?
Porque o Presidente da República, em Portugal, não governa. Limita-se a tentar influenciar quem o faz. Ora, a influência de uma governação mais à direita, de momento, não é possível nem conveniente e «puxar» para a esquerda não está nos ânimos do futuro Presidente. Por isso, tudo ficará como até aqui.
A «tranquilização» económica que se admitiu, durante a campanha eleitoral, iria ser posta em prática por Cavaco Silva foi «milho aos pombos»! Ou seja, foi um processo de juntar o que andava disperso e conseguir o número desejado de eleitores. A entrada de Portugal na área do Euro fez fugir ao controle da banca nacional, em especial do Banco central, a execução de políticas financeiras que poderiam alterar o rumo dos acontecimentos económicos. Quanto mais o país se precipita na incapacidade de sobrelevar a crise, cavando mais fundo o deficit orçamental (por adopção de políticas fiscais que atrofiam as políticas económicas), mais dependente está da evolução europeia. Entrámos numa espiral invertida cuja travagem não se vislumbra possível no curto nem no médio prazo. As fortunas pessoais não são produtivas nacionalmente e como o que imperou nos dez anos de Governo Cavaco Silva foi o enriquecimento pessoal ao invés do nacional, o tecido produtivo está a esboroar-se continuamente por falta de uma política proteccionista que não pode ser efectivada dadas as regras definidas por Bruxelas. O que ontem não se acautelou, hoje está perdido.
Portugal cada vez mais é menos dos Portugueses e os Portugueses cada vez mais são menos de Portugal. E quanto mais o Estado se dilui e se desfaz do desempenho de um papel activo na economia (como interventor e corrector dos desvios que prejudicam os Portugueses), menos a solução da crise está na sede do Governo nacional. A solução não fica à deriva; vão ser os grandes interesses estrangeiros quem a controlará, mas isso não quer dizer que o façam no sentido de um melhor trem de vida dos e para os Portugueses.
A única solução visível é o aumento do egoísmo (que, por definição, é sempre individual!). Salve-se quem puder, porque os velhos, os inválidos e os desempregados, dependentes do Estado por terem acreditado no sistema de segurança social que norteou as nossas vidas durante os últimos anos do regime fascista e a primeira década após 25 de Abril, porque esses estão perdidos! Cada vez mais o Estado vai tentar descartar-se dos encargos sociais que tinha assumido honestamente com os cidadãos. O Estado tem de ser, na conjuntura actual, uma pessoa desonesta e credora de pouca confiança. Estamos a voltar aos tempos da consolidação do Liberalismo, depois da vitória de D. Pedro iv, em 1834, com a agravante de que a maioria de nós, classe média, já não é agricultora e de que a agricultura já não é salvação para ninguém. Agora somos todos verdadeiros proletários que, de nosso, só possuímos a força de trabalho para vender pelo mais baixo preço.
Ao que nós chegámos!