Há dias o Presidente da República, comandante supremo das Forças Armadas por inerência de funções, convidou para com ele almoçarem, no palácio de Belém, o primeiro ministro, o ministro da Defesa Nacional e mais os quatro generais - generais de quatro estrelas - chefes, respectivamente, do Estado-Maior General das Forças Armadas, do Estado-Maior da Armada, do Estado-Maior do Exército e do Estado-Maior da Força Aérea. Não foi um repasto de mera cortesia. Foi, de acordo com as notícias trazidas a público pelos órgãos de comunicação, uma oportunidade de, sentando à mesma mesa, ouvir os responsáveis governamentais e os comandantes militares sobre as medidas anunciadas e aprovadas em conselho de ministros quanto à redução de algumas regalias de carácter social/assistencial de que os militares usufruem como forma de compensação da condição especial que lhes é imposta.
No final do almoço, interrogado pelos jornalistas, o ministro da Defesa Nacional, uma vez mais, veio reforçar a ideia de que havia perfeita sintonia entre os generais e o Governo e que competia aos militares cumprirem as obrigações e os direitos que lhes são impostos pela sua condição.
Salvaguardando a inocência ou/e verdadeira boa vontade do Presidente da República, este almoço foi a armadilha na qual caíram os chefes militares os quais tinham plena obrigação de a perceber, antes de aceitarem o convite, tanto mais que foram oficiais que ainda fizeram a guerra em África! Vejamos, porquê.
Ao sentar à mesma mesa o primeiro ministro e o ministro da Defesa Nacional com os altos comandos militares o Presidente Jorge Sampaio hierarquizou os convivas e, ao fazê-lo, limitou-lhes a capacidade de manobra: os generais estão subordinados ao ministro da respectiva tutela. Ou discordavam ali, ou nunca mais poderiam opor-se-lhe. Das palavras do ministro aos jornalistas transpareceu a unanimidade de pontos de vista e a absoluta concordância. Mas há mais.
Ao sentarem-se estes convivas à mesa de refeições do Presidente Sampaio os generais aceitaram que as associações representativas dos militares não tinham legitimidade para discutirem as medidas do Governo em paridade com eles, chefes militares. Ao fazerem isto esqueceram vários aspectos: em primeiro lugar, que vão ser estas associações que os vão representar quando passarem à inactividade - o que para alguns deles não faltará muito - ; em segundo lugar, que, transparecendo para o público em geral, uma ideia de concordância e bom entendimento com os governantes, os militares do activo, da reserva e da reforma se deixam de rever nos seus chefes para se identificarem com as associações que, de facto, se batem e defendem os interesses que lhes são legítimos e caros; finalmente, que não mantém canais de diálogo - formais ou informais - abertos e constantes com as associações de militares de modo a existir consonância entre chefias militares, associações e os próprios militares representados.